Meu pai voltou da cirurgia
bastante agitado, promovendo o maior rebu no CTI. Fomos chamados, na área de
espera, para enviar alguém que lhe fizesse companhia e conseqüentemente o
acalmasse. Uma de minhas irmãs foi escalada de acompanhante aquele resto de
noite. Fui substituí-la pela manha.
– E ai como foi a noite? Ela abre o amplo
sorriso e diz: - Foi ótimo, tivemos função a noite inteira! O velho passou a noite
inteirinha em delírios e tendo as mais variadas visões, disse ela. E tome
causos.
Noite alta, minha irmã esta sentada
ao lado da cama no interior do box no CTI. A sua frente do outro lado do
corredor senta-se um enfermeiro alto, corpulento, em posição bem frontal. Meu
pai a certo momento fica agitado e começa a sacudir a grade da cama. Minha irmã
pergunta: - que foi, pai? – Me ajuda a abrir esta porta minha fia. – Que porta,
pai? Você esta no hospital, não se lembra? – Me ajuda a abrir, fia! Eu quero
descer deste automóvel! – Que isso pai? Que automóvel? – Esse aqui. Vamos logo.
Aquele homi ali quer a minha vaga.!
Já pensando que ele ta falando em
vaga do leito, e em paciente esperando pra deitar na cama, minha irmã se pôs a
rir. – O que isso pai, aquele é o enfermeiro. - Infermero que nada, ele qué é
minha vaga. Aqui mal cabe um carro e ele quer por o dele aqui, vamo embora
rápido pra num criar caso!
Após um bom tempo ele se acalma e
dorme novamente.
Daí a pouco, xixi! Aquela
dificuldade, molha tudo!
Minha irmã solicita um fraldão
para o resto da noite.
Meu pai diz: - Fralda em mim,
não! Esse trem fica frouxo e eu mijo na cama toda!
Depois de muito convencimento ela
consegue que ele use, se ela colocar o tal do fraldão. Drama! Como ela vai por
o trem, sem botar os documentos dele a mostra?
Ela, criativa, divide um dos troços
em três e cria um tapa sexo: – Pai, vou virar pra lá, você tira as calças e poe
isso aqui por cima e segura, depois você me chama.
- Pó virá, já tou pronto. E lá vai
ela colocar a coisa.
Fraldão colocado ele admira e
elogia: - Ninguém sabe botar esse trem como você. Agora vou poder mijar
sossegado a noite inteira!
Meu pai é o único sobrevivente
dos filhos do primeiro casamento de meu avô.
Dentre eles, tinha o Dr Jose Rocha,
médico, apelido familiar de Neném, pouco mais velho que meu pai, e foi quem
propiciou a vinda dele, do interior, para Beagá. Morto a mais de 20 anos.
Madrugada alta, quase
alvorecendo, meu pai fica novamente inquieto, querendo se levantar a qualquer
custo. Minha irmã tenta acalmá-lo.
Ele rebela-se: - Você num faz nada
que eu quero, eu quero descer e calçar meus sapatos. - Pra que, pai? Você não
pode se levantar, tá recém operado.
- Pois eu vou, disse ele, o Neném
chega daqui a pouco pra me visitar!
Minha Irma, que sempre tem uma na
ponta da língua, logo diz: - Pai, se o tio Neném, o tio Fabio ou qualquer outro
seu irmão vier te chamar, não vá! Fala que você não quer ir! O tio Neném já
morreeeeeeu! Ele só vai aparecer aqui se ele quiser te levar pro além!
Alguém aqui acha que o véio falou
mais em sapato?