Toda família tem seu doido, a minha tem, e isso um dia foi
de grande utilidade.
Lembro da morte da minha bisavó
como se fosse hoje, ela morava sozinha numa casinha estilo bem romântico, e
atrás, num barracão morava um sobrinho dela. Todos os domingos ela “abria os
salões” para receber visitas de seus descendentes. Todos davam uma passada por
lá. Ela servia um cafezinho e bolo de fubá para todos, todos os domingos sem
falta. Esta era a tradição. Morreu aos 99 anos e 11 meses. Isso mesmo! Festão
preparado. Gente se imperequetando para vir de longe para a festa de 100 anos. Com a morte ocorrendo tão
próximo ao evento, os convidados foram os mesmos. Até a missa de aniversário,
que seria comandada pelo Bispo da Diocese Dom Serafim, foi celebrada, só mudou
o palavrório. O Velório foi em sua própria sala e em homenagem a ela foi
servido o mesmo menu. Velório bastante concorrido, todos estavam lá. Em um
canto da sala estava triste, cabisbaixo, um de seus filhos. Homem de 1.90m,
forte, bem apessoado, mas deficiente mental. O que ele tinha nunca foi
diagnosticado. Se não se conversasse com ele a sua deficiência passava
despercebida. Se chamava Zé Rocha. Convivi muito com ele. Era como um menino,
dócil, contador de casos, tinha uma imaginação fantástica, pura fantasia. Nós meninos,
adorávamos. Terminado o velório, segue o féretro para o cemitério do Bom Fim, à
saída fica impressa em minha mente uma imagem, que até hoje, anos depois, me
emociona.. O jardineiro de minha bisavó, velhinho de seus 80 anos, pequenino,
frágil, permanece postado em seu jardim e à passagem do caixão levanta
suavemente a mão e acena. Permanece acenando até o cotejo virar a esquina, lá
longe. Foi uma demonstração de respeito, afeto e carinho, gesto de singela
delicadeza em toda sua simplicidade. Seguimos para o cemitério e após todas as
homenagens prestadas, rezas e flores, inicia-se o sepultamento. Baixado o
caixão o coveiro começa a jogar displicentemente as pás de terra. Ainda estamos
muito atrasados. Até hoje em Belo Horizonte não existe elevador para enterro.
Igual aqueles de americano, sabe? De repente escuta-se: Brruumm, Brruummm, era
o som surdo da terra batendo com força na tampa do caixão. Todos que estavam ali
ficaram constrangidos, incomodados com aquela cena deprimente.
No mesmo instante ouve-se aquele
vozeirão, era o Zé:
- Ei, toma cuidado aí. Você não
esta enterrando a sua mãe, essa ai é a minha.!
Tem ou não tem de ter um doido na
família?
E o coveiro continuou o serviço
pianinho, pianinho....
0 Já deram um pitaco, e o seu?:
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