Tela do artista plástico moçambicano Antero Machado.

Tela do artista plástico moçambicano Antero Machado.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Essa mãe é minha!

Toda família tem seu doido, a minha tem, e isso um dia foi de grande utilidade.
Lembro da morte da minha bisavó como se fosse hoje, ela morava sozinha numa casinha estilo bem romântico, e atrás, num barracão morava um sobrinho dela. Todos os domingos ela “abria os salões” para receber visitas de seus descendentes. Todos davam uma passada por lá. Ela servia um cafezinho e bolo de fubá para todos, todos os domingos sem falta. Esta era a tradição. Morreu aos 99 anos e 11 meses. Isso mesmo! Festão preparado. Gente se imperequetando para vir de longe para a festa de 100 anos. Com a morte ocorrendo tão próximo ao evento, os convidados foram os mesmos. Até a missa de aniversário, que seria comandada pelo Bispo da Diocese Dom Serafim, foi celebrada, só mudou o palavrório. O Velório foi em sua própria sala e em homenagem a ela foi servido o mesmo menu. Velório bastante concorrido, todos estavam lá. Em um canto da sala estava triste, cabisbaixo, um de seus filhos. Homem de 1.90m, forte, bem apessoado, mas deficiente mental. O que ele tinha nunca foi diagnosticado. Se não se conversasse com ele a sua deficiência passava despercebida. Se chamava Zé Rocha. Convivi muito com ele. Era como um menino, dócil, contador de casos, tinha uma imaginação fantástica, pura fantasia. Nós meninos, adorávamos. Terminado o velório, segue o féretro para o cemitério do Bom Fim, à saída fica impressa em minha mente uma imagem, que até hoje, anos depois, me emociona.. O jardineiro de minha bisavó, velhinho de seus 80 anos, pequenino, frágil, permanece postado em seu jardim e à passagem do caixão levanta suavemente a mão e acena. Permanece acenando até o cotejo virar a esquina, lá longe. Foi uma demonstração de respeito, afeto e carinho, gesto de singela delicadeza em toda sua simplicidade. Seguimos para o cemitério e após todas as homenagens prestadas, rezas e flores, inicia-se o sepultamento. Baixado o caixão o coveiro começa a jogar displicentemente as pás de terra. Ainda estamos muito atrasados. Até hoje em Belo Horizonte não existe elevador para enterro. Igual aqueles de americano, sabe? De repente escuta-se: Brruumm, Brruummm, era o som surdo da terra batendo com força na tampa do caixão. Todos que estavam ali ficaram constrangidos, incomodados com aquela cena deprimente.
No mesmo instante ouve-se aquele vozeirão, era o Zé:
- Ei, toma cuidado aí. Você não esta enterrando a sua mãe, essa ai é a minha.!
Tem ou não tem de ter um doido na família?
E o coveiro continuou o serviço pianinho, pianinho....

0 Já deram um pitaco, e o seu?:

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